MASP

O Renascimento pelo avesso: imagens, ficções e discursos coloniais

Horário
19h-21h
Duração do Módulo
ONLINE
1, 8, 15, 22, 29.10 e 5.11.2021
SEXTAS
(6 aulas)
Investimento
Público geral
5x R$ 57,60
Amigo MASP
5x R$ 48,96
*valores parcelados no cartão de crédito
Professores
Renato Menezes
Em geral, restringe-se à ideia de “mundo colonial” o ecossistema das colônias. Com isso, a participação das metrópoles na colonização limita-se, via de regra, ao deslocamento de colonos ao espaço geográfico da colônia, no âmbito de sua conquista, ocupação e exploração. O objetivo desse curso é oferecer um panorama mais amplo e complexo da noção de “mundo colonial”, que implique diretamente o desenvolvimento e a circulação de ideias que sustentaram e justificaram, em termos teóricos, a empresa colonial nas Américas. As aulas terão como premissa a ideia de que a tarefa de descolonização do pensamento passa pelo entendimento profundo dos mecanismos que estruturam o projeto colonial, a fim de desarticulá-los de dentro para fora.

Organizados por temas e ancorados na análise de imagens, os encontros terão sempre como ponto de partida uma obra ou evento marcante do assim chamado Renascimento europeu, marco histórico de abertura da chamada primeira época moderna. Essa obra desdobrará questões que permitirão percorrer lugares por vezes inusitados onde se formula e se gesta o pensamento colonial. Este curso não tem como objetivo apresentar uma leitura “decolonial” destas obras, mas, ao contrário, refletir criticamente sobre o modo como o colonialismo é indissociável da própria ideia de cultura e civilização que o mundo ocidental eurocentrado projetou para si mesmo. O interesse será, portanto, exercitar um olhar antropológico sobre a arte europeia, decompondo as narrativas visuais que contribuíram para estruturar as práticas coloniais.


IMPORTANTE
As aulas serão online por meio de uma plataforma de ensino ao vivo. O link será compartilhado com os alunos após a inscrição. 
O curso é gravado e fica disponível durante 5 dias.
Os certificados serão emitidos para aqueles que completarem 75% de presença

Planos de aulas

Aula 1 – 1.10.2021 
Introdução 

É comum encontrar definições de “Renascimento” como movimento artístico-cultural e período histórico situado cronologicamente entre os séculos 15 e 16 e geograficamente na Itália, tendo o antropocentrismo e a redescoberta da Antiguidade Clássica como seus elementos fundantes. Esta definição, inventada somente no século 19, está na origem da ideia de Ocidente e da ideia de missão civilizatória que marca o gesto colonial moderno. A essas ideias acrescenta-se o encontro (ou choque) de culturas ocorrido no âmbito da expansão marítima europeia, que amplia a oposição entre civilização e barbárie, e fundamenta o cânone eurocêntrico. No primeiro encontro alunos serão introduzidos à uma perspectiva crítica da ideia de Renascimento, e irão refletir sobre os contrastes entre os fatos históricos e as narrativas que foram criadas sobre eles, além de comentar brevemente sobre as pesquisas recentes feitas nesse campo.

Aula 2 – 8.10.2021
A abóbada da Capela Sistina e a questão das origens

Os afrescos da abóbada da capela Sistina, pintados por Michelangelo entre 1508 e 1512, reescrevem a crônica da gênese do mundo, das origens da humanidade e do povoamento da Terra. Esta obra, considerada um dos pináculos do assim chamado Renascimento italiano, reativa, indiretamente, uma importante questão aberta já na carta de Américo Vespúcio intitulada Novus Mundus (1504), a saber, a especulação a respeito das origens dos povos indígenas americanos. Neste encontro, alunos irão discutir como a questão das origens reaparece como um tema que orienta o colonialismo moderno, com ecos na arte do século 19 e do século 21.

Aula 3 – 15.10.2021  
O homem vitruviano e a questão da humanidade 

O “homem vitruviano” é talvez o mais célebre elogio da forma humana como medida de todas as coisas, um tratado visual sobre a centralidade do homem no mundo. O desenho, realizado por Leonardo da Vinci em c. 1490, é considerado um paradigma: de um lado, do modo como os tratados antigos, sobretudo o de Vitrúvio, permanece uma fonte de “verdades absolutas” na virada do século 15 para o 16, e, de outro, do interesse humanista pela composição do corpo humano. A questão da natureza humana, no cerne dessas especulações, é profundamente reavaliada nos relatos de navegantes europeus, sobretudo na exegese do contato entre estes e a população indígena americana. Neste encontro, alunos irão estudar como a definição de humanidade que se esboça na primeira época moderna relativizou a natureza humana dos povos originários da América e justificou sua exploração. 

Aula 4 – 22.10.2021
A invenção da perspectiva e a questão do espaço 

Um dos marcos convencionais da origem da pintura moderna é a invenção da perspectiva, código visual que procurou organizar o mundo sob o crivo da racionalidade numérica. A perspectiva está também profundamente imbricada com o desenvolvimento dos grandes projetos arquitetônicos de teatros clássicos e, por extensão, à interpretação do mundo como teatro. Neste encontro, será estudado como a ampliação da escala do mundo ocorrida com a expansão marítima europeia desestabiliza a cosmovisão europeia, tenciona as convenções de organização espacial e cristaliza interpretações reducionistas e instrumentalizantes da natureza.

Aula 5 – 29.10.2021
Os fragmentos arqueológicos e a questão do subterrâneo

A história da arte europeia entendeu que a “redescoberta da Antiguidade Clássica” constituiu um fator determinante tanto para o que se chamou, posteriormente, de Renascimento, quanto (e por consequência deste último fenômeno) da adoção do cânone clássico. Os fragmentos escondidos sob a terra, assim como a sua descoberta, tornam-se objeto de profundo questionamento tocando aspectos fundamentais como a relação entre o homem e a agricultura, homem e a nacionalidade e a extração mineral, além de constituir um desafio para o artista visual, que trabalha por imitação da natureza, representando aquilo que vê. Neste encontro, alunos irão refletir como as especulações a respeito do subsolo determinam e são ao mesmo tempo impactadas pela ambição colonizadora de extração mineral nas Américas.

Aula 6 – 5.11.2021
A descoberta da Domus Aurea e a questão da mestiçagem 

A descoberta da Domus Aurea, a Casa Dourada do Imperador Nero, impõe para a história da arte o desafio de pensar o ressurgimento dos modelos clássicos antigos não pelo viés do rigor dos modelos da estatuária, mas, ao contrário, pela dimensão onírica de pinturas chamadas “grotescas”. Marcadas por suas formas híbridas e orgânicas, abertas à fantasia das quimeras e outros seres fantásticos, as “grotescas” fornecem uma boa via de reflexão sobre a forma mestiça, isto é, o produto do encontro e da mistura de “raças” nas Américas, inclusive para pensar criticamente a forma neutra com que esse termo foi muitas vezes empregado. Neste encontro, serão discutidas as origens e as consequências formais e sociais do que poderíamos chamar de “elogio à mestiçagem”, a partir do que os elementos das “grotescas” permitem pensar.
 

Coordenação

Renato Menezes é historiador e crítico de arte. Doutorando em história e teoria da arte pela École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS, Paris). Mestre em história pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e graduado em história da arte pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Co-organizador de França Antártica: ensaios interdisciplinares (Editora da Unicamp, 2020). Prepara uma tese sobre a relação entre terror e maravilha na recepção da obra de Michelangelo. É grad intern no Getty Research Institute, onde colabora com o núcleo de arte latinoamericana do departamento curatorial. Membro da Sociedade Brasileira de Estudos do Renascimento (SBER). Suas pesquisas concentram-se no estudo da cultura visual e literária da primeira época moderna.

Conferencistas