Nos anos 1940 e 1950, no início de sua carreira como pintora, a gaúcha Ione Saldanha (1919-2001) produziu obras figurativas, como cenas cotidianas, retratos e casarios. Geometrizou, progressivamente, as cidades e as arquiteturas, tornando-as abstrações. Nesses trabalhos, os jogos de verticalidade e horizontalidade assumem papel estrutural. No final da década de 1960, Saldanha passou a utilizar outros suportes, abandonando a superfície bidimensional e pintando sobre ripas, carretéis e bambus. A estrutura do bambu materializa componentes geométricos e padrões da própria natureza. Ademais, o bambu é encontrado em abundância na vegetação tropical; sua forma e sua textura lembram mastros, bandeiras ou totens típicos de festividades e de rituais religiosos brasileiros. Saldanha produziu, nessas obras intituladas Bambu (sem data), esculturas que, se expostas em conjunto, podem criar experiências que remetem a instalações. Destaca-se o ritmo criado pela sucessão de variações cromáticas, que parecem se disseminar e se projetar pelo espaço. Ao nos aproximarmos das peças, vemos também grafias anônimas inscritas sob as pinturas. As escolhas da pintora estabelecem diferenças em relação à trama da planta, criando um jogo entre as marcas e as divisões da geometria pictórica colorida, os ritmos orgânicos do próprio vegetal e a ação humana anterior à pintura.
— Guilherme Giufrida, assistente curatorial, MASP, 2018