Ao lado de Maurice Denis (1870-1943), Édouard Vuillard (1868-1940) e Paul Sérusier (1864-1927), Bonnard foi um dos integrantes do grupo dos Nabis, que utilizavam cores puras aplicadas em superfícies planas e figuras
com contornos estilizados, de modo a acessar uma realidade para além do visível. O artista passou a privilegiar cenas de interiores domésticos, com protagonistas — muitas vezes familiares ou próximas — imersas em
pensamentos na intimidade de seu cotidiano. Bonnard também desenvolveu o uso sutil da luz, integrando tonalidades de cores de temperaturas diferentes em ambiências vaporosas, nas quais a luz parece atravessar uma
névoa.
Nu femininoé um bom exemplo desse tratamento cromático próprio a Bonnard. A figura se desprende de um fundo indefinido no qual a alternância de nuances de tonalidades sugere um ritmo vibrante. Essa diferença de tratamento entre
figura e fundo é reforçada pela massa de cor mais clara que parece emanar, como uma aura, do jovem corpo nu. A modelo é Marthe de Méligny (1869-1942), que passou a posar para Bonnard a partir de 1890 e com quem ele
se casou em 1925. Ao longo do tempo, Marthe foi sempre representada jovem, reiterando um ideal de beleza atemporal, apesar do transcorrer dos anos. De fato, no momento em que o quadro foi pintado, entre 1930 e 1933,
Marthe tinha em torno de 60 anos.
Enquanto as vanguardas construíam e destruíam novas formas de representação, Bonnard variou no interior de seu mundo os temas essenciais de sua arte: paisagens, naturezas-mortas, nus, adotando criticamente as
sugestões que eram mais adequadas a seu discurso. Por volta de 1927, sob a influência do último Renoir, Bonnard chega a um novo lirismo baseado na cor que, ao longo do tempo, adquire maior força. O quadro do Masp
Nu Feminino, datável de 1930 (Camesasca sugere uma datação posterior, de 1932-1933), representa Marthe como a eterna adolescente na memória do pintor. O “intimismo” do artista reconstrói a realidade na forma de uma redescoberta
gradual, que como em Cézanne conserva uma dimensão durativa, comparável à poética de Proust.