Desde os anos 1980, Sérgio Sister explora os limites entre pintura e escultura, experimentando diferentes combinações cromáticas e modos de aplicação da tinta sobre telas, caixas ou ripas de madeira. Sua produção nos anos 1960, no entanto, era bastante figurativa e baseada em aspectos da arte pop, como a apropriação de imagens da cultura de massa, o uso de cores saturadas e colagens. Diferentemente da pop estadunidense, a apropriação de elementos dos meios de comunicação em massa, no caso de Sister e de outros artistas no contexto brasileiro, eram respostas críticas às crescentes ameaças que sofriam pela ditadura civil-militar, instaurada no país de 1964 até 1985. Na pintura Sem título, as figuras são antropomórficas, mas seus corpos são distorcidos, como naquela à direita construída com colagens e costuras, aludindo a corpos fragmentados. Marcas de spray enfatizam o aspecto fantasmagórico daquela à esquerda e são usadas para representar as íris dos olhos, gerando escorridos, como lágrimas. Ela segura um jornal que foi colado, destacando apenas a manchete de uma notícia em tom sensacionalista sobre uma mulher brutalmente assassinada. Acima desse trecho está pintado à mão o neologismo “jornalha”, que ironiza os meios de comunicação de massa ao unir as palavras jornal e canalha. A colagem da manchete, em preto e branco e com letras geométricas, contrasta com o aspecto lisérgico e multicolorido da pintura, mas o conjunto reitera um aspecto central do momento histórico e político de sua produção: a violência.
— Leandro Muniz, assistente curatorial, MASP, 2023