Nascido em uma família burguesa e abastada, Manet iniciou seus estudos com a literatura e ingressou na carreira de oficial da marinha. Depois de uma viagem ao Rio de Janeiro, persuadiu a família de sua vocação
artística. Convencido de que a renovação da pintura deveria basear‑se no estudo da tradição, copiou as grandes obras do Louvre e viajou pela Itália, Holanda, Áustria e Espanha. Precursor do impressionismo, Manet foi
uma figura essencial na passagem entre a arte acadêmica e a arte moderna. Grande mobilizador da cena artística na segunda metade do século 19 em Paris, foi interlocutor de escritores e poetas como Émile Zola
(1840‑1902) e Charles Baudelaire (1821‑1867). Suas personagens encaram duramente o espectador e parecem desafiar a tradição e a crítica. Em
A amazona — Retrato de Marie Lefébure, há um forte contraste entre o fundo, com verdes diluídos e esmaecidos, e a figura da mulher, com o volume bem demarcado de sua roupa preta. O cavalo se volta para o fundo da tela, como se fosse penetrá‑ la. A
amazona olha para fora, enquanto cavalga e balança uma varinha, objeto que parece ter sido pintado duas vezes — um
pentimento(“arrependimento”, em italiano). Em geral, tais correções são escondidas pelos artistas, mas Manet tentou agregar a sensação de movimento à composição.
A inscrição à direita “ed. manet” não é uma assinatura, foi aposta pela Sra. Manet após a morte do pintor, conforme atesta declaração expressa dela: “Certifié d’E. Manet/Mme. Manet”. Notam-se dois principais
pentimenti, no chicote, anteriormente mais levantado, e no perfil das costas da retratada, anteriormente mais à direita.
A retratada é Marie Lefébure,
A Amazona – Retrato de Marie Lefébure, sobre a qual nada se sabe, além do fato de que esse seu retrato faz pendantcom outro retrato eqüestre, de idênticas dimensões, do pintor Émile Guillaumin, talvez, seu marido.
Guillaumin era um pintor de paisagens e não deve ser confundido com seu homônimo, mais famoso e também paisagista, Armand Guillaumin (1841-1927). Émile expôs no Salon de 1868, era um
habituédo Café Guerbois, além de freqüentar a casa do colecionador de gravuras japonesas, Alphonse Hirsch, também amigo de Monet. O retrato de Émile Guillaudin, conservado em uma coleção particular em Deaborn, Michigan, é
datado de 1870 e pode oferecer algumas indicações sobre a tela do Masp. Segundo Duret (1902, n. 123), Guillaumin posou para o retrato eqüestre no jardim da casa de Alphonse Hirsch, na rue de Rome, em Paris, e seria
novamente representado por Manet no
Bal à l’Opéra, de 1873 (Nova York, coleção Havemeyer). Segundo Camesasca (1987, p. 64), uma datação em torno de 1870, ano do retrato de Guillaumin, seria naturalmente lógica, mas aspectos estilísticos e sobretudo uma pincelada
mais fragmentada induzem a não se afastar excessivamente da datação tradicional, por volta de 1875-1876 (Jamot, Wildenstein e Bataille 1967, n. 32), ou imediatamente antes (Rouart e Orienti 1970, n. 214).
A paisagem com cavalos esvoaçantes ao fundo, na tradição da iconografia dos
derbys, não faz senão sublinhar, por contraste, os grandes recortes de cores convergentes, de pretos e roxos escuros, que unificam sem transição o primeiro plano e conferem ao retrato um caráter abstrato.