A partir de referências à iconografia da pintura europeia, o trabalho de Thiago Martins de Melo questiona as narrativas oficiais da história do Brasil. O artista aponta para as consequências da colonização e da escravidão até hoje, que persiste no racismo e nas desigualdades sociais e étnicas atuais. Em pinturas de grande formato, que acumulam espessas camadas de tinta, de cores fortes, aplicadas de maneira direta e expressiva sobre a tela, as obras do artista demonstram como essa violência foi mascarada por trás de conceitos como mestiçagem e cordialidade. Em Madona mestiça do espelho, o artista reúne, em meio a uma natureza exuberante, diversas mulheres. No centro da composição, o artista situa a escrava Anastácia, figura do imaginário popular, conhecida por seus dons de cura e que, por ter persistido em ficar virgem – condição sempre associada à Virgem Maria –, foi sentenciada a utilizar uma máscara que cobria o nariz e a boca. Já no canto inferior direito no primeiro plano da pintura, o artista representa a sua esposa e filha. Mesclando histórias coletivas e pessoais, a obra tece um comentário sobre a ideia de maternidade, além de abordar a perversa história das amas de leite, vistas como mães generosas e nutrizes, narrativa que dissimula as violências brutais de um sistema baseado na exploração das populações africanas, com especial crueldade em relação às mulheres.
— Equipe curatorial MASP, 2017