Por Erika Zerwes
Dulce Carneiro (1929-2018) atuou como poeta e escritora, mais tarde escrevendo artigos para a imprensa paulistana e por vezes os ilustrando com fotografias realizadas por ela mesma. Aos 30 anos iniciou uma bem sucedida carreira como fotógrafa, que desenvolveu por mais de 3 décadas. Em 1951, Carneiro entrou para o Foto Cine Clube Bandeirante, um ambiente dominado por homens. Além de fazer parte de diversas exposições, escreveu artigos para o boletim periódico e dirigiu uma coluna intitulada Inquérito – Intelectuais brasileiros respondem: Fotografia é Arte?, que buscou aproximar da fotografia brasileira outros artistas e intelectuais. O FCCB promoveu importantes trocas entre a fotografia nacional e estrangeira, em especial de vanguardas europeias e norte-americanas, além de abrigar destacados exemplares da nascente fotografia moderna brasileira. A fotografia entitulada Passo certo, do acervo do MASP, mostra grande domínio técnico e maestria de composição, que sugere um diálogo com a fotografia construtivista. A fofógrafa cria um grande contraste entre os tons de cinza e preto, e entre as linhas da perna que corta os quadrados concêntricos do pavimento. A fotografia congela o movimento da passada que pisa o quadrado central. Jogando com a precisão de enquadre das linhas diagonais do pavimento, a imagem dá ainda mais dinamismo para as pernas que parecem caminhar decididas. Mais tarde, Carneiro se especializou na fotografia de arquitetura e industrial. Considerando-se uma operária da fotografia, registrou grandes obras da engenharia, onde se comparava aos trabalhadores dos locais que fotografava. Em 1990, no entanto, decidiu abandonar a fotografia. Como ato de rebelião, vendeu seus equipamentos e destruiu todo seu arquivo.
— Erika Zerwes, doutora em História, Unicamp, 2021