Nos anos finais de sua vida, sofrendo de alcoolismo, o pintor francês Henri de Toulouse-Lautrec (1864-1911) teve como acompanhante um antigo conhecido de sua mãe, Paul Viaud. Depois de conseguir alta de uma clínica
para dependentes, Lautrec recebeu Viaud e acabaram tornando-se amigos. Os dois passaram várias temporadas à beira-mar e em 1901, ano de sua morte, Lautrec pintou este grande retrato de Viaud vestido como almirante do
século 18. Antes de chegar ao MASP, a pintura decorava a sala de estar de um castelo no sul da França, exposta sobre a lareira. Viaud é representado como uma figura corpulenta, que irrompe prepotentemente,
gesticulando, no primeiro plano com a imponente massa vermelha da jaqueta de comodoro inglês. A figura está parcialmente fora do campo visual. Este recurso, presente em muitas obras de Lautrec, introduz uma dinâmica
que desloca o foco da atenção para o pequeno navio preto que parece afastar-se rapidamente deixando um leve rastro branco no verde mar tempestuoso. O suporte possui um valor dinâmico fundamental na composição da
perspectiva e da imagem. Preparado em um tom claro de cinza esverdeado parece inchar-se e subir como uma onda tremenda, que leva para cada vez mais longe o diminuto galeão, em direção de um céu que vai ficando mais
escuro e ameaçador, cheio de presságios lúgubres de naufrágio. Por meio de planos de cor contrapostos, a massa vermelha do corpo do almirante torna-se um elemento estático em relação à imensidão do oceano arrastando
o barco e prestes a engoli-lo. Há quase uma paródia da famosa estampa
A grande ondade Katsushika Hokusai, mas possivelmente represente também o estado de espírito do artista no final de sua vida. O MASP possui dez obras de Lautrec em seu acervo, e realizou uma mostra dedicada ao artista em 2017:
Toulouse-Lautrec em vermelho.
Como os amigos Maurice Joyant, Émile Davaust ou como o almirante Paul Viaud, Lautrec amava a navegação ao largo, e ele próprio era um autêntico homem do mar, hábil nadador e intrépido timoneiro. A pedido da condessa
de Toulouse-Lautrec, Viaud acompanha o artista após seu internamento em uma clínica de Neuilly, em 1900, com a missão de impedi-lo de beber, cuidado vão, pois Lautrec iludia-o, ocultando a bebida no oco de sua
bengala.
Executado entre julho e agosto de 1901 e destinado a decorar a sala do castelo de Malromé,
Paul Viaud em Almirante do Século XVIII (O Almirante Viaud), pertencia talvez a uma série de grandes telas, interrompida pela morte do artista. Não necessariamente inacabada, ela assinala não apenas um retorno de Lautrec à pintura pura, mas sobretudo um dos mais monumentais
e intensos momentos da cultura pictórica francesa às vésperas dos paroxismos cromáticos do
fauvisme.