Courbet foi o principal representante do realismo na pintura francesa do século 19. Pintava temas sociais, o trabalho no campo, retratos crus, brutos, não idealizados. Rechaçava a pintura classicista, inspirada em
modelos estéticos da Antiguidade. Também recusava o imaginário dramático do romantismo, que refletia os modos de vida e as aspirações da burguesia. Courbet participou ativamente dos movimentos revolucionários
democráticos de 1848 e da Comuna de Paris (1871), primeira tentativa de governo socialista realizada depois da derrota da França na guerra contra a Prússia (1869-70). Alinhadas aos seus ideais, suas pinturas passaram
a refletir um posicionamento permanente contra a situação política e a arte proposta nos Salões oficiais, a ponto de, em 1858, o artista organizar uma mostra com seus trabalhos recusados, o
Pavillon du Réalisme. Além de Zélie Courbet, o MASP possui a pintura Juliette Courbet (1873-74). As modelos eram irmãs do pintor, pintadas com quase trinta anos de intervalo. A pintura mantém as superfícies escuras típicas do artista,
com predominância de cinzas, sépias e poucos detalhes coloridos que destacam as figuras do fundo. As feições da menina não são idealizadas e sua expressão é descontraída e afetiva.
Por Luciano Migliaccio
A modelo do quadro Zélie Coubert é a irmã de Courbet, Zélie (1828-1875). O pintor descreveu-a em suas cartas como sendo “sempre doente, sempre corajosa, sempre amável”. Para Camesasca (1988, p. 38), as feições da retratada indicam uma idade por
volta de 2o anos, o que permite datar a pintura por volta de 1847. A crítica concorda em situar a obra neste ano ou no anterior. A sobriedade técnica na abordagem da pintura e da realidade também concorrem para
situar a obra numa data próxima à viagem do pintor à Holanda. A força plástica das pinceladas luminosas no rosto e na mão que o toca, as camadas densas dos brancos e dos cinzas que definem o colarinho, contrapondo-se
ao fundo sombrio e aos volumes negros do vestido e do penteado, contribuem para a criação de uma intensidade psicológica e sentimental que não teme a comparação com os retratos de Saskia de Rembrandt. Estamos diante
de um daqueles “exórdios magistrais” do pretenso autodidata Courbet, que deviam entusiasmar Cézanne e assentar as bases do realismo contemporâneo em pintura.