Vivenciamos a crescente presença da arte e de artistas indígenas nos espaços que constituem o sistema de arte, não apenas como produtores de objetos e imagens, mas também como sujeitos que fazem a mediação entre modos de vida e diferentes compreensões sobre o mundo. Nessa perspectiva, podemos nos indagar sobre como essas relações se estabelecem não só no tempo do agora, mas em processos históricos que precisam ser confrontados, reavaliados e abordados sob a multiplicidade de olhares. Se a história da arte e os espaços museológicos se nutrem de modo recíproco, como a produção indígena foi e tem sido abordada e contextualizada nessas estruturas sistêmicas?
Ao reavaliarmos essas relações, levando em conta a complexa rede de tensões e negociações existentes entre indígenas e não indígenas, podemos considerar como o presente pode ser capaz de reorganizar práticas e mesmo o que entendemos como arte em geral, não apenas na perspectiva de uma recorrente via de mão única – na qual as chamadas artes “não ocidentais” são incorporadas à estrutura sistêmica já existente –, mas na chave contrária, na qual as artes e artistas indígenas podem transformar o que entendemos como arte e os modos como desenvolvemos nossas práticas nesse sistema.
IMPORTANTE
As aulas serão ministradas online por meio de uma plataforma de ensino ao vivo. O link será compartilhado com os participantes após a inscrição. O curso é gravado e cada aula ficará disponível aos alunos durante cinco dias após a realização da mesma. Os certificados serão emitidos para aqueles que completarem 75% de presença.
Aula 1 – 5.9.2023
Entre a antropologia, a filosofia e a história da arte – as diferentes narrativas desenvolvidas por não-indígenas em relação a práticas indígenas
Por meio da análise de dois casos – a presença de urnas marajoaras em diferentes museus no país e a presença indígena em três recentes Bienais de São Paulo (32ª, 33ª e 34ª) –, propomos uma reflexão sobre trânsitos de objetos e de artistas indígenas, em diferentes chaves interpretativas, levando em conta algumas mudanças recentes ocorridas no sistema de arte. Propomos assim, que este encontro circunscreva o início de um conjunto de tópicos a serem considerados nos debates seguintes.
Aula 2 – 12.9.2023
Alegria de Viver, Alegria de Criar (1978): a exposição que nunca aconteceu
A mostra Alegria de Viver, Alegria de Criar foi concebida por Mário Pedrosa para o MAM-Rio na segunda metade da década de 1970, após seu retorno do exílio; porém, ela nunca se concretizou, devido ao incêndio ocorrido no museu em 1978. Como podemos pensar questões relacionadas às exposições de artes indígenas, quando enfrentamos o caso de uma mostra que nunca foi realizada? Por meio da documentação disponível, pretendemos desenvolver uma cartografia do imaginário não indígena sobre essa produção, na passagem do moderno para o contemporâneo.
Aula 3 – 19.9.2023
Práticas de aproximação, inclusão e contaminação: Museu das Origens (1978), Mostra do Redescobrimento (2000) e Histórias Mestiças (2014)
Por meio da análise de três diferentes projetos e suas temporalidades (1978, 2000 e 2014), podemos acompanhar algumas transformações ocorridas nos modos como as artes indígenas foram consideradas em iniciativas de revisão da arte no Brasil, variando do imaginário antropológico ao artístico. Pretendemos, com este percurso, considerar as persistências e as possíveis transformações no imaginário de não indígenas e o trânsito de peças e imagens, entre a especificidade étnico-cultural e a multiplicidade constitutiva do país.
Aula 4 – 26.9.2023
A presença de indígenas em duas temporalidades: Exposição Antropológica Brasileira (1882) e Dja Guata Porã (2016) – e, ainda, Véxoa: Nós sabemos (2020)
Na chave do cruzamento de temporalidades, pretendemos elaborar uma reflexão sobre a presença de corpos indígenas em contextos expositivos, a partir de uma análise comparativa entre o final do século 19 (1882) e o início do século 21 (2016). Tomando duas mostras realizadas no Rio de Janeiro.
– Exposição Antropológica Brasileira (1882) e Dja Guata Porã (2016) – como estudos de caso, procuraremos desdobrar a proposta por meio de um terceiro elemento – a mostra Véxoa: Nós sabemos (2020), ocorrida em São Paulo –, de modo a fazer uma “triangulação”.
Aula 5 – 3.10.2023
Indígenas por indígenas: reconfigurando o sistema
Exposições como Reantropofagia (2019), Moquém_Surarî: arte indígena contemporânea (2021), Retomada da Imagem (2021), Nhe’ẽ Porã: Memória e Transformação (2022), Nhande Marandu – Uma História de Etnomídia Indígena (2022) colocam em evidência não apenas artistas indígenas, mas também curadorias e reflexões teóricas. A partir de um conjunto de pensamentos e posicionamentos indígenas, pretendemos avaliar como o conceito arte, em geral, vem passando por uma mudança de sentido, processo este em contínuo desenvolvimento.
Ivair Reinaldim é doutor em Artes Visuais (PPGAV-UFRJ, 2012), professor adjunto do Departamento de História e Teoria da Arte da Escola de Belas Artes e do quadro permanente do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da UFRJ. Membro do Comitê Brasileiro de História da Arte. Desenvolve pesquisa nas áreas de historiografia e teoria da arte, crítica de arte e estudos curatoriais.