O curso apresentará uma seleção de autobiografias de mulheres e homens negros que passaram pela experiência da escravização e da luta pela liberdade (nos Estados Unidos, Brasil e Cuba), publicadas entre fins do século 18 e ao longo do século 19. Durante os encontros, será discutida e analisada a produção iconográfica que se relaciona, direta ou indiretamente, com os textos.
Na exposição Histórias afro-atlânticas (MASP, 2018), por exemplo, a obra Portrait of an African, um óleo sobre tela de 1758, de autoria desconhecida, retratava Olaudah Equiano, uma das mais importantes figuras do abolicionismo estadunidense e autor de uma das mais conhecidas autobiografias do gênero. Na mostra também esteve presente a famosa gravura do abolicionista James Phillips (Plans and sections of a slave ship), de 1789 (mesmo ano de publicação da autobiografia de Equiano, com quem possuía relações). Assim como a capa de Ain’t I a Woman? A Midwest Newspaper of Women’s Liberation, publicado entre 1970 e 1974, e que faz referência explícita ao discurso de Sojourner Truth, em 1851. Truth publicou sua autobiografia um ano antes de proferir seu famoso discurso, o que a tornou conhecida na luta abolicionista, sobretudo aquela ligada às sociedades femininas do período.
O curso convida a redimensionar tensões entre representação e autorrepresentação; os modos de ver e os modos de ser; e entre a luta abolicionista organizada e a agência da população negra sob diferentes condições de interação social e também dedicará dois encontros para reflexão sobre o uso político-pedagógico das autobiografias e da iconografia discutida, evidenciando a potencialidade do debate que coloca em relevo a pluralidade das histórias do mundo afro-atlântico.
IMPORTANTE
As aulas serão ministradas online por meio de uma plataforma de ensino ao vivo. O link será compartilhado com os participantes após a inscrição. O curso é gravado e cada aula ficará disponível aos alunos durante cinco dias após a realização da mesma. Os certificados serão emitidos para aqueles que completarem 75% de presença.
Aula 1 – 11.9.2023
Sobre representação e suas fissuras
Apresentação do curso, do recorte e abordagem. Apresentação e discussão do conceito de representação. “Outremização” (Toni Morrison) e “Dispositivo Racial” (Suely Carneiro).
Aula 2 – 13.9.2023
Para além da escravidão: memórias, trajetórias e a construção do mundo afro-atlântico
Aproximação à historiografia da escravidão e da liberdade nas Américas e dos debates contemporâneos. Aspectos históricos da produção social de autobiografias de escravizados. Tensões entre representação e autorrepresentação na história e na arte.
Aula 3 – 18.9.2023
Arte e escravidão no Oitocentos
Panorama da história da arte no século 19. Apresentação e discussão do conceito de "cultura visual". Representação da população negra na arte oitocentista (Brasil, Estados Unidos e Cuba). Retomada histórica da exposição Histórias afro-atlânticas.
Aula 4 – 20.9.2023
Baquaqua (Brasil), tráfico atlântico e trânsitos da liberdade no mundo escravista
Discussão da autobiografia de Mahommad Gardo Baquaqua, com foco na diáspora africana no Brasil. Etnicidade. Historiografia do tráfico comercial de africanos e das revoltas em alto mar. Aspectos de história atlântica e história marítima.
Aula 5 – 25.9.2023
Manzano (Cuba), produção poética e circulação de ideias no mundo afro-atlântico
Discussão da autobiografia de Juan Francisco Manzano, com foco na diáspora africana em Cuba. Circulação de ideias escravistas e antiescravistas no Atlântico. Antiescravismo e abolição em Cuba. Literatura e abolicionismo.
Aula 6 – 27.9.2023
Equiano e Sojourner Truth (EUA), abolicionismos e as sociedades femininas na luta pela emancipação
Discussão das autobiografias de Equiano e Sojourner Truth, com foco na diáspora africana nos Estados Unidos. O antiescravismo no Atlântico Norte. Sociedades femininas e sociedades abolicionistas. Aspectos da resistência antiescravista nos Estados Unidos (Underground Railroad e literatura).
Aula 7 – 2.10.2023
Possibilidades político-pedagógicas de uso das autobiografias e iconografias do mundo afro-atlântico
Autobiografias, memórias e escritas de si no contexto educativo. Retomada do debate sobre representação e autorrepresentação. A dimensão política da representação em primeira pessoa e a construção de processos educativos (educação formal e não-formal).
Aula 8 – 4.10.2023
Apresentação e discussão de planos de aula/ações educativas
No início do curso, as participantes serão convidadas a elaborar propostas de planos de aula, ações educativas ou intervenções culturais que partam das reflexões realizadas durante as aulas e discussões. Neste encontro, algumas dessas propostas serão apresentadas e discutidas pelas participantes.
Rafael Domingos Oliveira é doutorando em história social pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre e bacharel em história pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), com financiamento da Fapesp. Foi professor da rede pública estadual de São Paulo. Coordenou o Núcleo de Educação do Museu Afro Brasil. É membro do Núcleo de Estudos e Pesquisas da Afro-América (NEPAFRO) e autor de artigos e capítulos de livros sobre escravidão, abolicionismo e pensamento social brasileiro. É autor do livro Vozes afro-atlânticas: autobiografias e memórias da escravidão e da liberdade (Editora Elefante, 2022). Atualmente coordena o Núcleo de Acervo e Pesquisa do Complexo Theatro Municipal de São Paulo.